A recente apresentação do plano fiscal para o ano de 2026, que delineia as intenções de dispêndio da União, parece ecoar a observação sagaz de Millôr Fernandes. O autor, em sua perspicácia, advertia que a perspectiva otimista muitas vezes ignora o cenário futuro. Embora a proposta governamental projete um superávit primário de R$ 34,3 bilhões, uma margem considerada estreita (equivalente a 0,25% do Produto Interno Bruto), a análise aprofundada das contas revela um panorama distinto. Ao incorporar a totalidade dos compromissos financeiros, inclusive os R$ 57,8 bilhões relativos a pagamentos judiciais que, por decisão superior, ficaram de fora da meta inicial, o balanço final inclina-se para um déficit efetivo de R$ 23,3 bilhões. Este desdobramento sugere que a esperança fiscal confronta-se com uma realidade mais desafiadora.
Para que os ambiciosos objetivos fiscais se concretizem, a administração federal deposita sua confiança em um conjunto de pilares que, por si só, representam complexos desafios. A aprovação irrestrita da Medida Provisória 1303 é crucial; esta legislação busca redefinir o regime tributário de diversas aplicações, abrangendo desde valores mobiliários e fundos até ativos digitais, além de eliminar certas isenções sobre instrumentos de crédito imobiliário e agrícola, os quais passariam a ter uma alíquota de 5% de Imposto de Renda. Adicionalmente, as projeções contemplam um robustecimento da receita proveniente do setor petrolífero e a potencial elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Contudo, a peça mais desafiadora neste tabuleiro político é a validação de uma proposta legislativa que visa revisar os privilégios tributários, com a expectativa de injetar R$ 20 bilhões em fundos adicionais. Tais reformas, que implicam o enfrentamento de interesses estabelecidos e a necessidade de articulação política, têm um histórico de considerável oposição no parlamento, uma dificuldade que se agrava com o cenário de distanciamento de setores da própria base de apoio do executivo.
A visão governamental para o horizonte fiscal de 2026 não se manifesta apenas na projeção de receitas, mas também nas premissas sobre os indicadores econômicos fundamentais da nação. A proposta alicerça-se em um crescimento do PIB de 2,44%, uma taxa de inflação de 3,6% e uma média da taxa básica de juros (Selic) de 13,11%. Contudo, esta projeção contrasta significativamente com a percepção do mercado financeiro, conforme revelado pelo Boletim Focus, do Banco Central. As expectativas dos agentes econômicos, embora tenham ajustado marginalmente para cima o crescimento do PIB de 2026, situam-no em um patamar mais modesto de 1,87%. Paralelamente, preveem uma inflação mais elevada, em 4,31%, e uma Selic final em 12,5%. Com exceção da taxa de juros, as projeções oficiais parecem navegar em águas mais esperançosas do que o consenso do mercado. Um especialista do "Mundo dos Negócios" comentou que, embora não se possa classificar o documento como "ficção", ele se inclina fortemente para o otimismo. A disparidade entre a projeção governamental de crescimento do PIB e a mediana do mercado sinaliza um risco: um crescimento econômico inferior pode resultar em arrecadação aquém do esperado, comprometendo a capacidade de atingir as metas. Dessa forma, a cautela expressa por Millôr Fernandes, que via no pessimismo uma forma de satisfação, serve como um lembrete pertinente, indicando que uma visão excessivamente rosada pode acarretar custos futuros.
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